Da necessidade à oportunidade: o potencial das novas centralidades
Nos últimos anos, tem-se observado uma aceleração notável no panorama imobiliário português: a migração populacional dos centros urbanos para áreas suburbanas cada vez mais distantes. Este fenómeno, embora já presente anteriormente, intensificou-se na época da pandemia, impulsionado pela procura de espaços mais amplos, proximidade a áreas verdes e pela expansão do teletrabalho. Esta resposta inicialmente conjuntural consolidou-se como tendência estrutural, alimentada pela inacessibilidade financeira dos principais centros urbanos, e estando a redesenhar não apenas onde vivemos, mas também como vivemos.
Assistimos hoje a uma deslocação crescente. Acredito que a maioria, não por escolha, mas por necessidade económica, com inúmeras famílias a abandonarem os locais de origem por impossibilidade de suportar os preços de mercado praticados. A população nas zonas periféricas tem registado grandes aumentos, com concelhos da Área Metropolitana de Lisboa tais como Mafra, Palmela e Sesimbra a apresentarem crescimentos anuais superiores a 8% nos últimos 5 anos, valores significativamente superiores aos registados no centro, de cerca de 2%.
O impacto desta transformação é visível: áreas que anteriormente apresentavam um desenvolvimento menos expressivo estão a transformar-se rapidamente. Observamos um crescimento significativo na construção nova em concelhos mais próximos de Lisboa, como Loures, Odivelas, Amadora e Seixal, mas também uma crescente procura para o desenvolvimento de projetos diferenciados em zonas mais distantes, como Sesimbra e Setúbal. Estas zonas estão progressivamente a desenvolver as suas próprias centralidades, com novos polos comerciais, serviços e infraestruturas a emergirem para dar resposta a uma população em rápida expansão. Em paralelo, temos visto em muitos concelhos uma redução da percentagem de pessoas que trabalha em Lisboa, como Odivelas e Amadora, sugerindo uma consolidação visível destas áreas, com uma maior concentração da força de trabalho local e uma crescente autonomia funcional. Os números mostram ainda uma evolução de perfil sociodemográfico, com aumento da população com formação superior e rendimentos médio-altos, o que tenderá cada vez mais a exigir e modificar a oferta atualmente existente nestas áreas.
Esta evolução tem-se também materializado na proliferação de parques empresariais e tecnológicos nas periferias, que atraem não apenas pequenas empresas locais, mas também multinacionais, criando postos de trabalho qualificados fora dos centros tradicionais. O Lagoas Park em Oeiras, o Taguspark em Porto Salvo, a Quinta da Fonte em Paço de Arcos e o Alfrapark na Amadora exemplificam esta tendência, contando com empresas como a Cisco, Ayvens, Novartis e SIBS, além de diversos serviços partilhados de multinacionais que escolheram estas localizações para as suas operações. Estes parques empresariais estão a investir fortemente em inovação e sustentabilidade, e com preços bastante mais competitivos do que nas zonas centrais, tornam-se alternativas muito atraentes para as empresas. Temos visto também o crescente interesse na integração residencial nestes contextos, como forma de criar ecossistemas onde o trabalho e habitação coexistem, reduzindo deslocações e promovendo melhor qualidade de vida. Simultaneamente, observamos uma sofisticação da oferta comercial e de serviços. Deste modo, os grandes centros comerciais periféricos já não são meras réplicas dos existentes nas áreas urbanas, mas desenvolvem-se como destinos em si mesmos, com propostas abrangentes e diferenciadas.
Este desenvolvimento territorial apresenta, no entanto, desafios significativos. A necessidade de coordenação metropolitana torna-se evidente face à fragmentação administrativa entre municípios. A pressão sobre as infraestruturas existentes exige investimentos significativos em redes de transporte público e mobilidade. Esta reestruturação surge como um fenómeno emergente, com o risco de repetir nas periferias problemas anteriormente associados aos centros, tais como o acelerado aumento dos preços imobiliários, a sobrecarga das infraestruturas de transportes e a insuficiência de equipamentos e serviços públicos para fazer face ao rápido crescimento demográfico. A nível imobiliário, estas zonas apresentam valores cada vez mais inacessíveis para a classe média portuguesa, tendo Loures e Odivelas superado consecutivamente um valor médio de venda de 3,000 euros por m2 no segundo e terceiro semestres de 2025. O aumento dos custos de construção, a rápida valorização dos terrenos, a falta de oferta de arrendamento, e um quadro fiscal desfavorável têm impossibilitado o desenvolvimento de habitação mais acessível. Assim, assistimos a uma tendência de subida de preços que se propaga para áreas distantes dos centros urbanos, tradicionalmente vistas como alternativas económicas, e que registam agora aumentos de preços expressivos, cada vez mais afastados da realidade salarial nacional. Em Mafra, Palmela, Sintra, e Setúbal, o preço mediano dos alojamentos familiares cresceu anualmente mais de 12% nos últimos 3 anos. Este fenómeno tem impulsionado famílias para zonas progressivamente mais afastadas dos centros urbanos e muitas vezes já fora da própria Área Metropolitana de Lisboa. Torres Vedras exemplifica esta tendência, registando um crescimento anual do preço mediano de venda superior a 11% nos últimos 3 anos, sustentado pelo contexto anteriormente mencionado e impulsionado por um polo empresarial cada vez mais robusto, complementado por infraestruturas estratégicas como o Hospital do Oeste, escolas internacionais, centros de investigação avançada e uma estrutura educacional crescentemente sólida.
Estima-se que esta tendência se manterá devido à crescente atratividade do país e às dinâmicas demográficas que têm conduzido ao aumento do número de agregados familiares (+2,6% na última década) e à redução da sua dimensão média (-4,6% no mesmo período). Esta diminuição deverá continuar, com uma projeção de decréscimo de 3,2% até ao final de 2031, acompanhada pelo aumento da esperança média de vida, fatores que impactam significativamente as necessidades habitacionais. Estima-se ainda que num futuro próximo a procura continue a superar a oferta, a qual tem apresentado valores historicamente baixos na última década (cerca de -70% em unidades licenciadas e cerca de -80% em unidades concluídas), o que conduzirá a um ritmo mais lento na disponibilização de novos produtos imobiliários.
Desta forma, a questão fundamental que se coloca não é se esta migração continuará, mas como será gerida e orientada. Encontramo-nos perante uma oportunidade única para criar polos urbanos mais equilibrados e sustentáveis. O desafio é evidente: transformar esta migração numa possibilidade para redesenhar o desenvolvimento urbano em Portugal, criando comunidades inclusivas, sustentáveis e adaptadas às necessidades contemporâneas da população. Este processo de transformação das periferias representa, em última análise, uma oportunidade para criar um modelo urbano, transitando de um paradigma centralizado para uma estrutura mais policêntrica, onde o setor imobiliário deveria atuar como catalisador de desenvolvimento estruturante, apoiado por incentivos fiscais estratégicos, parcerias público-privadas, planeamento de infraestruturas para a mobilidade e processos administrativos eficientes de forma a fomentar o investimento responsável e o equilíbrio socioeconómico das comunidades.
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